
Antes de tudo, é relevante dizer que desde muito cedo eu nutro uma inquietude tremenda com relação aos fatos impostos pela sociedade. Sempre muito curiosa, recordo-me que aos 12 anos, quando tive a primeira oportunidade de sair do país, desenvolvi uma vontade muito grande de entender melhor como as coisas funcionavam e por qual razão nosso Brasil era tão diferente de outros países.
Para isso, eu acreditava que era necessário não só viajar, mas mudar de lugar algumas vezes com o intuito de poder ampliar o olhar e desenvolver um senso crítico, tanto com relação ao nosso próprio país, quanto aos demais.
Confesso que inicialmente eu enxergava o de fora como algo extraordinário, em detrimento dos diversos defeitos que possuímos. Me via constantemente insatisfeita com o nosso país, mas nunca deixei de amá-lo e tentar fazer algo para melhorá-lo. Com a maturidade e as diversas viagens que pude realizar, passei a entender que nem tudo é como parece. É preciso olhar para ver.
Aos poucos, pude quebrar meus preconceitos e valorizar mais as nossas qualidades, que, diga-se de passagem, são reconhecidas mundialmente: a simpatia, simplicidade, gentileza, felicidade, o jeito sociável e a espontaneidade brasileira.
Por outro lado, tive que encarar alguns fatos: os brasileiros também são vistos como impontuais, irresponsáveis com os compromissos e que só pensam em festa e futebol. E isso sempre me incomodou bastante. Afinal, somos bem mais que carnaval e caipirinha e eu sentia que deveria fazer algo para espalhar isso pelo mundo.
Para entender melhor essas questões e tentar gerar mudanças nesse tipo de pensamento (que vejo como superficial), resolvi apostar em um dos meus sonhos: me mudei pra Europa, especificamente para Linz, na Áustria, para participar de um projeto da AIESEC*, uma organização mundial presente em 126 países, que tem como objetivo principal promover a paz através de intercâmbios e da criação de novos líderes para um mundo melhor.
O meu trabalho é voluntário, no qual eu ensino crianças e adolescentes (09–19 anos) vários assuntos sobre o Brasil, dentre eles: cultura, esporte, lazer, economia, política, turismo, moda e culinária. Nada melhor do que começar a plantar as sementinhas nas primeiras gerações, não é mesmo?

Com relação a esses primeiros dias, destaco alguns fatos interessantes sobre essa experiência na Áustria:
- A maioria dos estudantes vão sozinhos à escola, usando transporte público. Sim, eu já vi crianças entre 04–05 anos sozinhas no trem e acho que isso é um importante demonstrativo do quanto os seus pais se sentem seguros em permitir isso e o quão é imprescindível gerar autonomia desde cedo. Já imaginou você deixando seu filho sozinho num ponto de ônibus no Brasil?
- Aqui há muitas escolas internacionais, onde pessoas de vários países (Bósnia, Afeganistão, Alemanha, Áustria, India, Nigéria, etc.) estudam na mesma escola. A diversidade é algo que tem sido muito trabalhado por aqui, pois eles entendem que dessa forma podem construir uma sociedade mais igualitária e justa.
- Apesar de toda apreensão que existia, os alunos foram super receptivos, interagiram, fizeram questionamentos e nos ensinaram muito sobre a cultura austríaca.
- Existe um respeito muito grande pelo professor em sala de aula. Basta um olhar para eles entenderem que devem fazer silêncio e isso é algo de extrema importância, pois eles carregam isso pra fora do ambiente escolar.
- A pontualidade austríaca é admirável. Confesso que tem sido um desafio enorme pra mim não atrasar 1 minuto sequer, mas eu tenho me adaptado bem a esse costume. PS.: eles ficam chocados quando digo que isso não é comum no Brasil.
- Eles são muito gentis e cordiais, apesar de serem um pouco fechados. Mas com o nosso “jeitinho brasileiro”, conseguimos amolecer os seus coraçõezinhos e eles facilmente se sentem à vontade para interagir de forma mais próxima.
- Por último, é muito interessante ver como eles gostam do Brasil, apesar de não conhecerem bem o que há por trás do futebol e carnaval. Quando discutimos sobre fatos mais relevantes, eles se sentem atraídos pelo assunto e ficam surpresos. É dessa forma que desconstruímos e transformamos os seus olhares sobre nós.
Assim, acredito muito nesse tipo de trabalho, pois, pouco a pouco, podemos gerar mudanças mais profundas, quando esses jovens vão entrar no mercado de trabalho com uma visão melhor sobre nosso povo e nossa história. Eu acredito no impacto disso, à medida que muitos deles já disseram ter interesse em visitar o Brasil, quem sabe até virarem investidores um dia. Enfim, essa é a minha forma de fazer a minha parte, conhecer melhor o meu país, desenvolver diversas habilidades e apresentar seu lado bom e ruim (com críticas construtivas, claro) aos mais diversos povos.
Como bem colocou Gandhi: “Seja a mudança que você quer ver no mundo”.
É exatamente isso o que eu levo pra vida e espero que seja apenas um dos pequenos passos dentro desse longo processo de aprendizado, pois o chamado interior que eu sinto é muito forte para ficar apenas sentada na minha cadeira reclamando dos nossos problemas.

*Se você se interessou em participar de algum projeto da AIESEC, me coloco à disposição para maiores informações. (georgiaflima@gmail.com)